Carlos Augusto Machado Veiga – Engenheiro-Arquiteto nota Cem

Passou o aniversário dos 70, do nosso talentoso engenheiro – arquiteto, e ninguém me disse nada. Só o valente e quase centenário hebdomadário “O Município”, registrou com justiça, honra e circunstância, a grande data,

CARLOS AUGUSTO MACHADO VEIGA é patrimônio biquense, também cirurgião dentista, mas de longa data, hábil e vivo articulador político.

Mas trato hoje de mais outra faceta do nosso generoso amigo, que para muitos será motivo de espanto. Refiro-me ao engenheiro-arquiteto, que acaba de deixar para a posteridade consagradora obra.

Com minha mulher e filha, fomos até a fazenda que pertenceu aos pais da querida e grande dama biquense, Conceição Machado Veiga.

Bela propriedade centenária, perdida no tempo, que o nosso brilhante Dr. Bertoldo Machado Veiga adquiriu para que o rico patrimônio não se perdesse.

Incumbiu o irmão Carlos Augusto, o dentista, que cuidasse de sua arcada dentária, com inúmeros dentes já perdidos, outros bem cariados, necessitando urgente de seus cuidados profissionais.

Carlos Augusto iniciou a intervenção cirúrgica, com seu motor de diamante, e emendou as velhas colunas tomadas por cupim, com cimento, cortando as partes doentes, num corajoso e sábio trabalho de cálculo, nível e peso.

E o velho porão, com algumas paredes derrubadas, despontou num amplo salão em toda extensão da sede da fazenda. Transformou uma antiga roda de engrenagem numa original mesa, com tampo de vidro.

Drenou todo o terreno, desviando a água para um ribeirão, plantou grama ao redor da fazenda, árvores e flores. Limpou o avental, e no andar de cima, restabeleceu a cor da pintura do século passado, as gravuras, reformou as portas e janelas, ampliou quartos, e fez no terreiro de café uma capela, com porta de uma igreja antiga.

Construiu cascata, bar, varandas, enfim, palavras não descrevem o que o nosso Niemayer pintou e bordou na propriedade do irmão. É hoje um local de abrir a boca, e encher os olhos e o coração de tanta beleza.

Os administradores de nossa cidade não podem se dar ao luxo, deixando de aproveitar a “genialidade” de Carlos Augusto Machado Veiga.

Aquele privilegiado terreno no coração da cidade e a Rua Cônego João Pio necessitam de urgente tratamento. Porque não solicitarem uma participação do nosso cirurgião dentista.

O local pode se tornar um ponto de referência e atração turística. Ganharemos um pulmão verde, espaço para crianças e áreas de lazer com gramados, árvores e bancos – O Parque dos Operários.

O 70 anos de Carlos Augusto é apenas uma data do tempo físico. Bicas precisa ainda conhecer o avançado espírito criativo, o amadurecimento e o brilho de admirável figura humana, que não envelhece e só nos honra com sua estima e velha amizade.

Salve, salve meu jovem artista, que encanta a natureza.

(Crônica do saudoso Chicre Farhat, publicada no jornal O MUNICÍPIO, em 30 de abril de 2008)

Júlio Cesar Vanni, meio século de trincheira

Júlio Cesar Vanni, meio século de trincheira

Há dias, caro amigo e camarada de longas e duras batalhas me telefonou:

– Rapaz, como o tempo passa. Estou completando cinquenta anos de jornalismo. Consegui viver nessa selva de armadilhas e julgamentos apressados, levianos.

Ele tinha razão. Ainda estava vivo e na trincheira. Seu fôlego determinado, a capacidade de servir, tudo permanecia intacto, com o mesmo combustível alimentando a velha chama: salvar os cofres públicos das velhas aves de rapina, da incompetência.

A postura continua inflexível. Mais que a voz rouca das ruas, sua bravura é um momento de consciência humana. Jamais escreveu para agradar aos poderosos ou render homenagens suspeitas. Nunca o moveu a tola vaidade, de apareceu dizendo coisas que nada acrescentam, sem importância na vida cidade. Massagear o próprio ego, evitando tratar qualquer assunto sério, não faz seu estilo. Baboseiras, não.

Instrumento de trabalho, sua pena é espada e borduna, e civismo, chamamento de responsabilidade, poderosa arma do povo, que o orienta e defende sempre.

No campo raso da luta conheci JÚLIO CÉZAR VANNI à frente do “Jornal do Pequeri”. Também frequentei suas páginas com minhas labaredas. Enquanto viveu o jornal, foi intensa a barragem de fogo contra a mediocridade e a mentira dos politiqueiros vazios, tontos. E caiu de pé, atirando até o último cartucho, sem rendição.

Nossa região deve muito a JÚLIO VANNI. Incalculável fortuna. Quantas tolices e prejuízos evitou, quantos benefícios trouxe com a crítica lúcida, seu claro espírito público. Reivindicou e brigou de peito aberto. Mas nunca se dobrou. Em primeiro e único lugar vinha o interesse da coletividade.

Não preciso destacar aqui suas corajosas campanhas. Tantas foram, que atravessam e enobrecem todos esses cinquenta anos, com a luminosidade de um esplendor solar. Quem duvidar basta ler suas colunas nos vários jornais em que ainda escreve, com fecundidade de causar inveja. É um oceano profundo de amor à vida e a dignidade.

Combatente firma, nada arrefece o entusiasmo de JÚLIO CÉSAR VANNI, tal o apetite de estar na linha de frente, sem nunca faltar pólvora. Viajante compulsivo, traz de outros países a visão madura dos acontecimentos e transmite toda sua experiência através de uma prosa didática, cheia de ensinamentos. Nada escapa ao seu faro de professor-repórter apresentando sempre a mais colorida e rica lição.

Como aviso às gerações, merecia uma estátua de corpo inteiro à entrada de sua terra, homenageando o autêntico inconfidente de ideias, desbravador da cultura.

Quem ali chegasse, ao ver o monumento seria impregnado da força vital, de ígnea esperança e altivez desse transformador inconformismo abençoado de frutos generosos.

Dessa matéria se constrói o futuro. Dessa argamassa se erguem as cidades. Dessa fibra nascem os homens que comandam os destinos de outros homens. Os idealistas têm a marca da grandeza – e só dela se edifica a obra consagradora, que fica na no bronze da história e no coração do povo.

(Crônica do saudoso Chicre Farhat, publicada no jornal O MUNICÍPIO, em 31 de dezembro de 1999)

A fortaleza da ternura

Maria da Glória Fávero Retto

Há pessoas que marcam um destino e definem uma época. No jeito de ser, no recato e pudor de singela vida.

Não é a rumorosa presença, sob as luzes do exibicionismo, da ostentação vazia, distante dos livros e das reflexões responsáveis.

Não é a atividade empresarial, o frio balcão de negócios, os lances duvidosos na ambição de grandes fortunas. Conheço alguns cofres humanos…

Tão pouco refiro-me às lutadoras que ganham as batalhas em profissões liberais e revolucionam o convívio social de um novo tempo.

Não. A personagem de que vos falo é a mulher do lar, a dona de casa que cria seu mundo próprio junto do marido, dos filhos e netos, no suceder das gerações.

Aquela criatura suave que abandonou o campo da feroz disputa, das ilusões passageiras, e se voltou unicamente para a definitiva estrutura, o alicerce familiar erguido no exemplo e na honra.

Bendito o país que pudesse ter em sua maioria lares assim construídos nos pilares da renúncia e no amor solidário. Outro seria nosso destino. A cidadania desperta ali, naquele calor humano, no respeito aos valores permanentes do espírito, na lição generosa aprendida desde cedo. De aconchego moral tão rico nasce o líder verdadeiro, sem ressentimento ou frustração, de amplo horizonte.

Em sua singularidade, MARIA DA GLÓRIA FÁVERO RETTO é bem o estilo inconfundível da mulher mineira do que ela tem de mais tradicional e autêntico, trazendo aos que ela convive a certeza de sua presença atenta.

A casa é sua fortaleza. Nela Glória Retto edificou um templo de paz. Ninguém desconsolado e triste deixará de colher a flor da compreensão, do sonho e carinho. Não há mágoa que resista o sereno otimismo de seu limpo coração.

Em horas de lazer, Glória Retto borda. Sua rara habilidade é proclamada aos quatro ventos. Mas a expressão maior do seu talento vem da tessitura humana, que soube organizar em torno de si, no abençoado trabalho de ternura.

Ainda há pouco, ela saiu da reclusão, preocupada com a saúde, para nos prestar solidariedade. Como sempre, a querida dama não se omitiu no momento da dor.

Antiga crença diz que ao lado de todo grande homem há uma grande mulher. Certa ou errada a asserção, no seu caso, porém, confirma-se plenamente a sabedoria popular: ela foi por mais de três décadas a esposa inexcedível de Francisco Retto Filho, notável figura de cidadão.

No seu canto, quieta, Glória Retto protege e ampara. No silêncio, ela diz tudo.

Que contribuição maior pode dar à sua gente tão belo comportamento? Em seu viver há grandeza, diferentes caminhos de participação. Presidiu o Lactário, colaborou com a Caixa Escolar, em diversas obras assistenciais.

Abdicou das vaidades, fugiu dos perversos. Fazendeira do Taruaçu, seu universo é um doce pomar de frutos maduros, onde brota as águas das fontes, que revigora a caminhante e o guerreiro encontra sombra e repouso.

(Crônica do saudoso Chicre Farhat, publicada no jornal O MUNICÍPIO,
em 30 de novembro de 1995)