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Apagando o passado

Minha mãe estava podando as roseiras do nosso jardim, e eu estava sentado na mureta, olhando os carpinteiros trabalhando do outro lado do córrego.

Dona Cota, nossa vizinha, vinha com sua elegância costumeira, inclusive, debaixo de uma sombrinha colorida, que estava na crista da onda. Parou e comentou com indignação a demolição do hospital. “Ana, você está presenciando de camarote a derrubada de uma das mais belas construções que Bicas tem.” Minha mãe não deixou por menos: “Dona Cota, meus filhos nasceram aqui em casa, mas tenho dois netos que nasceram no hospital.

Foram as únicas vezes em que entrei lá. Sempre achei que os balaústres ingleses e os corredores dom palacete do Barão coisa de cinema, além de dar um ar aristocrático `Praça dos Aposentados e ao Grupo…” Dona Cota apontou o dedo em direção à demolição e com os olhos umedecidos observou: “Deveria haver uma lei que proibisse esse descalabro.”

“Outro dia fizeram a mesma coisa com o casarão do Coronel Joaquim José de Souza. A família do Barão de Catas Altas, talvez nem saiba desse malefício contra o nosso patrimônio”, continuou… “Uma cidade que não preserva sua cultura patrimonial não tem alma. Certamente, vão construir algo que ninguém vai notar…” Eu, impávido ali, vendo o gurpião cortando uma enorme peça de madeira que sobrou do caramanchão que ficava na parte interna do hospital. Dona Cota se foi… e na desatenção de minha mãe um espinho espetou-lhe o dedo…

Bicas desaparecendo!