Marmita requentada
Quem nunca se esbaldou matando a fome, forrando o aparelho digestivo com uma marmitinha requentada?
No Brasil, a maioria dos trabalhadores comem de marmita e ainda nessa mesma maioria, leva de casa a marmita que foi preparada na véspera pra comer na sua hora de almoço. Uns esquentam na lata de sardinha com álcool, outros costumam fazer uma fogueira pra aquecer várias marmitas ao mesmo tempo.
O peão de obra, da construção civil, geralmente descola uma lata de sardinha vazia ou coisa parecida, um pedaço de tábua usada pra forma de concreto, prego e monta seu pequeno fogareiro com álcool.
Enquanto isso, no Supremo Tribunal Federal, onde os magistrados ou togados recebem o teto do salário permitido acrescido de vários benefícios, muitas vezes maiores que o salário de 95% dos trabalhadores desse país, tais como: auxílio moradia, auxílio saúde, auxílio transporte e outros, ainda comem do bão e do melhor da culinária internacional… Os melhores pratos harmonizados com vinhos nobres, pontuados em no mínimo 94 pontos Robert Parker!
Além disso, esses verdadeiros banquetes servidos em qualquer dia da semana, duram em média de 2 a 4 horas, pra poder dar tempo, pro caboclo diferenciado dos demais seres humanos, de degustar o primeiro prato ou entrada, o segundo prato (carnes, frutos do mar e massas), sobremesa, licor e cafezinho 100% arábica, moído naquele exato momento sem deixar a água ferver… Essa sequência não pode ser interrompida nem por um pedido de habeas corpus do nosso mais famoso presidiário.
Nessas alturas, o peão engoliu seu grude salgado e com pouca proteína, mas muito glúten e já está estendido num canto da obra fazendo o “quilo” de pelo menos 30 minutos corridos, tentando absorver aquele bolo fecal que se formou no seu primitivo sistema digestivo.
Outros trabalhadores, além de não terem nem 30 minutos de hora de almoço, comem em pé nas copas improvisadas de estabelecimentos ou correm pra algum selfie service sem balança, com um pedaço de carne a R$10,85, podendo repetir logicamente desembolsando mais 4 mirreis pra pegar mais uma carne.
No fim do dia, a produção desses 95% tem que ser suficiente pra movimentar toda a máquina administrativa executiva, legislativa e judiciária do Brasil, senão no dia seguinte o preço da gasolina sobe, falta remédio nos postos de saúde e as estradas ficam esburacadas, além de faltar dinheiro pra falta, digo, pra educação. E como diria Federico Fellini: E La Nave Vá!
Enquanto isso, do outro lado do Atlântico, no hemisfério norte, mais precisamente no velho continente, onde existe uma casta de pessoas, também, conhecida como jogadores do esporte bretão, apesar do fuso horário, também, são filhos de Deus e comem nababescamente os produtos filtrados pelo padrão de primeiro mundo. Quer dizer: a carne é brasileira, o café também e o cacau idem, pra dizer alguns produtos nossos, só que você não encontra-os no mesmo padrão nas gôndolas dos supermercados nacionais.
Pois bem… Mesmo assim tem gente que sai do subdesenvolvimento cultural, econômico e gastronômico desse lado infeliz da Linha do Equador só que esse lado “karmaleônico” do individuo não sai dele. Ou seja: o elemento foi criado à base de marmita requentada e como tem muito “larjam” manda buscar no Brasil pra comer em locais discretos, porém sofisticados, comidinhas que tem aos montes em Paris, por exemplo.
Porque não saborear um steak au poivre com um belo beaujolais ou ostras frescas de Marselha com champagne nacional?
Não, o cara prefere ir na contramão e se estrepar todo, pois comida requentada pode estar fora da validade.
Uma versão de bastidores, que não para em pé, assim como o nosso ex-craque, zapeada nas famosas redes sociais “hackeadas”, é de que a tal da marmita foi adquirida por 30 mil mais as despesas de viagem em primeira classe, já que a comida veio de longe e na fotografia parecia coisa de primeira. Porém, depois de comer e saciar a fome intercontinental, veio a conta: 30 mil euros ou melhor: R$ 150.000,00!
Isso é que eu chamo de marmita requintada!